quarta-feira, 30 de julho de 2008

Este blog

Para os poucos leitores, este blog pode parecer, digamos, um pouco fora do comum. E é mesmo. Diferente da maioria, o Injúrias Gratuitas não foge aos textos mais longos, algo que parece fora de moda. Lembro-me, por acaso, de uma professora cretina --- vocês verão por que --- dizer que um blog não pode ter textos longos. Este aqui pode, ué. Claro que a cretina tem um blog, cuja gramática é tão sofrível quanto seu rosto; e o estilo do texto é tão desleixado quanto a roupa da distinta doutora. Ainda assim, ela merece aplausos. Os feios têm lá seu lugar.

De qualquer modo, este espaço continuará a ter textos extensos. Ainda que este aviso seja breve.

Era Uma Vez uma tese equivocada

Minha colega de blog, leia post mais abaixo, já comentou acerca de Era Uma Vez, o novo longa do cineasta Breno Silveira, que estreou para o grande público neste fim de semana. O que se lerá aqui, portanto, não é uma outra análise. A referência à película, no caso, se deve ao fato de a obra fazer referência ao livro do jornalista Zuenir Ventura, Cidade Partida, publicado em 1993 pela editora Cia das Letras.

Quinze anos e muitas comoções midiáticas depois, com direitos a passeata na Vieria Souto e filmes sobre a questão da violência urbana, o cenário é talvez tão ou mais gritante que o explicitado pelo jornalista naquela reportagem com cara de pesquisa sociológica. Hoje, quando as ONGs praticamente dividiram as favelas em capitanias hereditárias, pode parecer absolutamente banal esse tipo de observação de campo. Outrossim, o relato de Ventura permanece original, o que não faz de suas, digamos, conclusões algo pertinentes. Em entrevista ao jornalista Pedro Doria no suplemento "Aliás", d'O Estado S.Paulo, Zuenir repetiu as platitudes sobre o morro e asfalto, como o vácuo do poder existente nas favelas, sem falar da "cultura" que tenta unir o que o morro separa --- mais precisamente sobre o funk.

Esse tipo de raciocínio, não raro, costuma se contrapor à visão de mundo realpolitik do brasileiro médio, a começar por sua expectativa sobre a razão de ser da polícia (partir para o conflito com os traficantes), bem como a respeito da natureza irremediavelmente corrupta das instituições e das pessoas. Não por acaso, filmes com tendência mais maniqueísta fazem a justiça na visão não apenas do brasileiro médio, mas também do supostamente ilustrado, como mostra a recente pesquisa do DataFolha. Voltarei ao tema depois.

quarta-feira, 23 de julho de 2008

A uma gaúcha do interior de São Paulo

Hoje eu não estou aqui para amabilidades. Estou para discutir pessoas, já que me disseram que pessoas não discutem argumentos e sim pessoas.

Quando uma pessoa é feia, sim, porque ela é feia, o que ela deve fazer para se destacar? Vale postar vídeos no Youtube? Vale inventar um sotaque que não te pertence? Vale contar uma vantagem que não existe, usar frases feitas? Vale ser pseudo?

Hum... eu diria que não. Mas quem sou eu, não é mesmo? Eu sou apenas uma pessoa (bonita --- hahaha) que lê (tenta) em média cinco livros por mês e que faz de tudo para que entre os cinco, pelo menos quatro tenham conteúdos relevantes. Bah (!), mas eu não estou aqui para falar de mim, como se isso dissesse alguma coisa.

Não ser pseudo é uma tarefa muito mais difícil do que podemos imaginar. Principalmente quando tudo está disponível e se aprofundar em alguma coisa parece tão difícil... tão cansativo... Aliás, que sono...

Voltemos à Virada Cultural. Pois é, os pseudos viraram seres culturais. Porque como disseram, a cultura faz-se aos poucos e não em um final de semana. Vem da tradição, tem uma história. Tudo isso demanda trabalho para adquirir-se...

Também me disseram que uma vez, uma mulher disse para o Churchill:" Você é um bêbado". E ele retrucou (e ganhou): "E a senhora é feia". Como eu sei que a Gaúcha do interior de São Paulo --- e muitas outras e outros --- não pode discutir argumentos, eu digo: burra que quer ser inteligente ganha meio ponto quando é bonita. Mas você é feia. Que pena. Pronto e ponto (para mim).

terça-feira, 15 de julho de 2008

Talvez porque perdoar seja mais difícil que amar

Complicado é falar de cinema e querer agradar a todos. Como maledicente não estou aqui pra isso, mas há pelo menos uma pessoa que eu gostaria que se sentisse lisonjeada com meu humilde texto.

Assisti ontem a pré-estréia do filme "Era uma vez...", do Breno Silveira. Admito que nunca fui fã da temática do primeiro filme do diretor, "Dois filhos de Francisco", mas a sensibilidade da trama e a forma como a história foi contada me tiraram do estado "vou odiar porque é sertanejo".

Em sua segunda obra, Breno conta uma história que seria duplamente clichê e eu explico o por que do "duplamente" mais a frente. Já li em diversas críticas expressões como "Romeu e Julieta", "menino do morro e menina do asfalto", entre outras. O enredo mostrado "com o coração" (como disse o próprio diretor em uma apresentação emocionada) tem tudo isso, mas não é clichê.

O filme conta a história de Dé (Thiago Martins), morador do Morro do Cantagalo, vendedor de cachorro-quente em um quiosque da praia de Ipanema e apaixonado por Nina (Vitória Frate), linda patricinha da Vieira Souto que lê Zuenir Ventura. Eles se apaixonam e têm que lidar, juntos ou separados, com o medo: com o medo de uma mãe que já perdeu um filho e não quer perder outro, com o medo de um pai que perdeu a esposa e quer o melhor para a única filha, com o medo de morrer por todos os lados; lidam com o preconceito e com a violência daqueles que outrora eram bons e também por medo mudaram de lado.


Posso dizer pouca coisa para não tornar esse post um spoiler, então digo que um final feliz seria um clichê simplesmente por ser um final feliz, um final trágico seria um clichê pela lógica dos filmes atuais não terem finais felizes. Mas talvez porque eu acredite que perdoar (superar, entender) é mais difícil que amar, eu acredito que Breno Silveira realmente entende de contar histórias com o coração.

Talvez eu devesse ter começado esse texto falando de coisas imperdoáveis, de situações que ficam impregnadas na alma e que nem todo amor do mundo pode apagar. Como quando um casal passa por algum problema, perdoa, mas no fundo um sempre culpa o outro por coisas que o consciente não percebe. O ser-humano É assim. Às vezes acha que nem liga para uma coisa, mas sente aquela raiva subliminar que pouco a pouco vai consumindo os sentimentos bons...

Depois de divagar volto para dizer que “Era uma vez...” vale a pena. A beleza não está somente na história, mas no cenário, na fotografia brilhante que comove até no trailer e na trilha sonora que conta com a participação de Marisa Monte – ao terminar o filme, se dê um tempo para não falar nada e apenas ouvir. Ver e ouvir, leitor. Talvez você se sinta tão cativado quanto eu.

segunda-feira, 14 de julho de 2008

O mundo (não) é chato!

O texto a seguir foi motivado depois de dias de audiência corrente de TV. Para dar nome aos bois, dos programas esportivos na TV. Tenho especial apreço por esse tipo de atração, já que, como brasileiro, não nego minha identidade cultural moldada à imagem e semelhança do que ocorre nos campos --- e dos comentários que tais acontecimentos geram. Daí que, de uns tempos para cá, torcer tornou-se tarefa das mais burocráticas. Alguém não pode mais tão somente torcer em paz, mas deve pedir, antes, pela paz e pedir desculpas pelo time de coração ou até mesmo para discutir sobre futebol. Tudo isso é proibido na libertinagem atual. Pede-se, antes de mais nada, que as desculpas sejam dadas caso o orgulho deste ou daquele esteja ferido. Uma bobagem sem tamanho.

Sabe-se lá como tudo isso tomou força. Tenho a impressão, no entanto, que isso começou lá atrás, quando alguns promotores decidiram por bem banir as torcidas organizadas - e uniformizadas - dos estádios de futebol na década de 1990. O motivo, para quem não se lembra, era a tenebrosa onda de violência nos estádios de futebol, que culminou com a morte de um torcedor na decisão de um torneio de juniores entre São Paulo e Palmeiras. De lá para cá, a violência diminuiu, mas, aqui e acolá, sobra pancadaria, e, como se sabe, onde há esse tipo de aglomeração, tais acontecimentos, se não são previsíveis, são esperados pelos sistemas de controle da sociedade. Dessa luta pela "Paz nos Estádios", houve também um levante do politicamente correto, movimento esse que atingiu desde o universo da política e dos costumes, como sabem os que leram o romance A Marca Humana, do escritor norte-americano Philip Roth, e alcançou até mesmo o universo da teledramaturgia, com os folhetins televisivos tratando, agora, das chamadas "questões sociais", sem mencionar outros níveis do patrulhamento, como é o caso da tentativa de inibir a campanha de alimentos com gordura por serem nocivas às crianças.

Por mais absurdo que pareça, o cenário do parágrafo anterior articula-se, objetiva e subjetivamente, dentro do poroso universo da linguagem. Ou seja, existe a evidente tentativa de fazer com que as pessoas adotem comportamentos, indumentárias, estilos de vida, hábitos de consumo e padrões de vida absolutamente vinculados a uma estrutura pautada pelos meios de comunicação de massa - e aqui não há qualquer teoria conspiratória contra a Rede Globo ou contra os Estados Unidos: trata-se, tão somente, de uma constatação do estado das coisas. Nesse sentido, observa-se que qualquer ação, ou reação, que tente fugir desse formato socialmente aceito pelos meios de comunicação como natural é fortemente rechaçado pelos formadores de opinião. Aqui, inclui-se, também, os meios considerados insurgentes, da famigerada cultura alternativa. Em um momento dominado pela cultura do status, o ser alternativo também foi absorvido pelo mercado, que, aqui e acolá, define o mundo de acordo com os rótulos existentes no supermercado de idéias. Também essas idéias estão pré-definidas, e é aqui que voltamos a falar de futebol.


É fato que, para constituir um padrão de audiência desejável aos níveis aceitos por uma determinada fatia do mercado consumidor, também os veículos esportivos tentam, de toda a maneira, não somente elitizar o futebol - haja vista o show de tecnologia das transmissões esportivas -, mas, principalmente, de higienizar o esporte que, até outro dia, era visto com desdém pela grã-fina com narinas de cadáver, personagem do genial Nelson Rodrigues. Agora, essa mesma grã-fina não só assiste ao "espetáculo", como também quer comentar o que achou da escalação do Carlos Alberto Simon para apitar o jogo. Para que essa, digamos, renovação do público possa acontecer com mais frequência, é necessário, mais do que sempre, ressaltar que o esporte é saúde, que a violência nos estádios não está com nada e, agora, mostrar como se deve efetivamente torcer: em linhas gerais, é feio secar o time alheio; bonito, mesmo, é fazer festa para a sua equipe, ainda que os jogadores, os "artistas da bola", não consigam vencer o jogo --- nada de dizer que foi batalha ou que o atacante é artilheiro. Isso tudo remete à cultura da violência que a linguagem - salve, Wittgenstein - quer esconder.

Enquanto a novilingua de Orwell chega às mesas redondas, lá e cá, alguns já têm alertado para esse processo de aparelhamento do politicamente correto no futebol. No ano passado, o jornalista Xico Sá alertou em sua coluna na Folha de S.Paulo para o fato de que, num jogo entre Brasil e Uruguai, não havia pobres ou desdetados no Morumbi: apenas VIPs. Mais recentemente, na final entre Fluminense x LDU, Juca Kfouri, após ressaltar a "festa da torcida", acusou o óbvio ululante: não havia negros no Maracanã. Por outro lado, começam a pipocar, aqui e acolá, o número de teses da academia sobre o futebol. De uma hora para a outra, a academia descobriu os estádios. Então, Hilário Franco Junior, professor medievalista da USP, gastou sua pena na Dança dos Deuses, longo ensaio sobre a relação entre a cultura nacional, a sociedade e o futebol. E neste ano foi a vez de José Miguel Wisnik, também pela Cia das Letras, publicar Veneno Remédio, obra com tom mais memorial, mas de pegada não menos intelectual, sobre o futebol. Para se ter uma idéia da dimensão da abordagem, Winik chegou a comparar os gols de Ronaldinho Gaúcho a uma visão de mundo pós-moderna. Sim, a grã-fina com narinas de cadáver também estava na Festa Literária de Paraty e aplaudiu as palavras do douto professor.

Para o andar de baixo, o futebol segue como o prazer em que o homem simples se refestela: xinga o adversário, briga com o colega, aproveita para comentar sobre a rodada nas segundas e quintas e não dá a mínima para essa tentativa de cerceamento do seu ir e vir. Do contrário, o mundo seria muito mais chato.

quarta-feira, 9 de julho de 2008

Manos e Minas, na TV Cultura

Manos e Minas, atração da TV Cultura, propõe-se a ser um programa que dialoga com a cultura da periferia. Hummm. Nada poderia ser mais preconceituoso. Pois, se na televisão faltam afrodescendentes (daí a grita da turma da diversidade cultural), na atração da TV Cultura sobram personagens (o grifo é meu) dessa "minoria". Ocorre, no entanto, que ali existe precisamente a qualificação dos afrodescendentes como pertencentes a um gueto. Em outras palavras, o que há é a generalização de um grupo, como se todos os gatos, à noite, fossem efetivamente pardos. O ledo engano está, também, na determinação do gosto, como se os afrodescendentes, de um modo geral, todos se afeiçoassem a um só gênero musical - o RAP - e a um só tipo de discurso - o do confronto, eles contra nós -, sem qualquer imaginação, muito menos diversidade.



Enquanto isso, a segregação racial da classe prossegue. Não há afrodescendentes nos cargos dirigentes, e o movimento negro (por que ninguém chama "movimento afrodescendente"?) prefere disputar o espaço "político" nas telenovelas - quer que seus personagens sejam os mocinhos, e não os vilões - em vez de lidar com os temas efetivamente importantes. Por essa razão, a discussão sobre a identidade cultural permanece difusa, perdida no palavrório acadêmico da teoria crítica e dos "estudos culturais", uma das chagas do pós-modernismo que persiste no vazio de idéias no Brasil.



Manos e Minas, portanto, convém à proposta desse grupo mais acadêmico; todavia, não atende ao interesse que deveria ser geral, isto é: tirar os afrodescendentes dos guetos; sair, de fato, da periferia, e não trazer o centro à periferia, como quer Regina Casé. Desse modo, enquanto o debate estiver no plano dos "estudos culturais", sempre com aspas, os afrodescendentes permanecerão onde se deseja: como personagens de uma história que se repete como velhota sem cessar, com escreveu Eça de Queiroz. Afinal, o que seriam desses teóricos, se não houvesse o preconceito tal como ele é? Do jeito que está, perpetua-se a existência de minorias e, pior, a cristalização de um discurso como realidade - para manos e para minas.

terça-feira, 8 de julho de 2008

Um filme com algum valor

Amar...não tem preço, filme estrelado por Audrey Tatou, estabelece uma controvertida ponte entre o cinema francês e o grande cinema norte-americano, mais especificamente no que concerne às produções com um formato de sucesso nos EUA. No caso do filme dirigido por Pierre Salvadori trata-se de uma comédia romântica, cuja tradição relembra o grande irmão do norte, como diria um crítico nacionalista. Nada de anormal quanto a isso, mas não deixa de ser curioso assistir a um filme francês com começo, meio e fim absolutamente previsíveis. Paradoxo ou sinal dos tempos? Ainda não se sabe, mas a sala estava vazia, a despeito da proposta do filme, ora em cartaz na Reserva Cultural.

quarta-feira, 2 de julho de 2008

Listas --- um livro, um disco, um filme

A idéia não é nova. Blogs como o de Jonas Lopes e o de Michel Laub também fazem uso dessa prática. E, a bem da verdade, com certa preguiça de escrever um texto longo, ao menos por enquanto, sobre cada um desses itens decidi elaborar uma lista, que segue abaixo:

Um Livro: Ciências Morais, de Martín Kohan, pela Cia das Letras (o autor estará na Flip). A história acontece no outono da Ditadura Argentina, no ano de 1982, mais precisamente num tradicional colégio que vem a ser uma espécie de microcosmo da vida no país naquele período.

Um Disco: Sansa Trio, álbum lançado originalmente em 1964, e agora, remasterizado, saiu em CD pela SomLivre Masters. Jazz de primeira.

Um Filme: A Questão Humana, um perturbador filme que traça paralelos entre os métodos do Nazismo e aqueles utilizados pelas grandes empresas nos chamados "modelos de gestão competitiva".